Orçamento público para população LGBTI+: desafios que persistem
Para ter uma real efetividade das políticas públicas voltadas para a população LGBTI+ é necessário destinar e aplicar o orçamento público. Em um contexto no qual o Brasil se encontra após governos que não destinaram dinheiro público para o desenvolvimento dessas ações, reconfigurar as Leis Orçamentárias Anuais serão importantes. Segundo levantamento do jornal Metrópoles, no ano passado o governo Bolsonaro não destinou nenhum recurso para que políticas LGBTI+ fossem executadas, como previsto pela LOA 2022.
O valor destinado para políticas LGBTI+ já era baixo para o ano passado, orçado em R$ 500 mil reais dentro do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), agora Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania - MDH. O movimento se iniciou no primeiro ano de governo de Bolsonaro, quando foi executado apenas 4,3% do orçamento voltado à Diretoria de Políticas de Promoção e Defesa dos Direitos LGBTQIAP+. Foram aplicados R$ 111,6 mil, de um orçamento total de R$ 2,6 milhões.
Já na LOA 2020, a primeira sob a responsabilidade do governo anterior, foi excluída a ação orçamentária para políticas LGBTI+. Elas puderam ser executadas, mas sem uma ação específica para aquele ano. Segundo Matheus Mazzilli Pereira, professor do departamento de Sociologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, a falta de orçamento para a execução de políticas públicas para a população LGBTI+ não começou com Bolsonaro. "Em outros anos, nunca houve formalização firme do orçamento. Só no nível das ações orçamentárias", explica Matheus.
"O orçamento foi um problema para a política LGBTI+. Em termos de orçamento, isso já é um problema desde o governo Dilma que, por uma série de questões, retira essas ações orçamentárias. Então, tal desinstitucionalização não vem de agora. Tivemos um pouco mais de dinheiro em 2006 ou 2007, mas muito pouco.", comenta.
O pesquisador afirma que uma das estratégias dos movimentos sociais nas últimas décadas foi buscar orçamento a partir de emendas parlamentares. "A ABGLT, por exemplo, fazia muito isso: realizar advocacy nos gabinetes de deputados e deputadas para incluir emendas orçamentárias para políticas LGBTI+. É uma estratégia que vai no limite. Até 2015, essas emendas não eram obrigatórias".
A transversalidade nos orçamentos
Durante os primeiros governos Lula, o orçamento para pessoas LGBTI+ foi diluído em outros ministérios, a exemplo do Brasil sem Homofobia, na pasta da educação. "O desafio é colocar orçamento LGBTI+ nessa lógica transversal e intersetorial. Havia outros ministérios, não só o dos Direitos Humanos, executando programas. Tínhamos os da educação, saúde e cultura, por exemplo. Já no governo Bolsonaro isso se agrava, pois sequer era possível falar de diversidade sexual e de gênero na educação", afirma Matheus Mazilli.
Agora, segundo ele, o novo governo deve formalizar esse orçamento novamente de modo transversal. "O desafio é a gente formalizar as políticas públicas para população LGBTI+ no orçamento. Que o novo governo, de fato, priorize os programas orçamentários, com investimento em diferentes áreas e que haja execução no orçamento", explica.
No início do ano, o Instituto Matizes produziu uma nota técnica relacionada à retomada de políticas públicas para pessoas LGBTI+ para o novo governo federal. Os 20 pontos que foram abordados no documento se estendem à realização de pesquisas periódicas de abrangência nacional com produção de dados robustos sobre a população LGBTI+ para orientar políticas e programas; inclusão das pessoas LGBTI+ na Política Nacional de Assistência Social; inclusão e padronização de um campo de preenchimento nos boletins de ocorrência que indique a motivação LGBTI+fóbica de um crime, por meio do Ministério da Justiça.
Algumas delas começaram a ser executadas a partir da criação da Secretaria Nacional de Defesa dos Direitos LGBTQIA+, dentro do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania. A destinação orçamentária para a Secretaria será decisiva para a efetividade e abrangência das ações federais voltadas à população LGBTI+.